23 de novembro de 2012

L'AMOURIA


Até a luva de pelica, às vezes, cria farpas.
Dedos afeitos à harpa, sem pertencer a altas falanges.
Ao primeiro ranger de dentes, vai ter-se com as facas.
Fraca mente por ser tão franca, pede perdão aos anjos rivais.
Vestia roupa branca ao limpar o choro oco das santas.
Preparava a sangria para os cristãos em castiçais.
Bebia água benta de quem sentou no colo da batina.
Batia a cabeça do coroinha na parede à luz de velas.
Tinha sede de vingança, mas o prato estava quente.
Assoprava a sopa com todas as letras que quisera.
Escrevia de caneta na barra da saia sem bainha.
Levantava a anágua para em novo emprego ser aceita.
Tombou à mesa dos burocratas e fora devolvida de bandeja.
Correu todos os riscos, então se pôs a descansar a vida.
Arfava o peito quando o leito era desfeito por ordem despedida.
Despojava-se de qualquer direito, por que amar deveria?

20 de novembro de 2012

FILTRO

Blindar a alma com as amarras do pensamento ou deixar entrar o que for pelos poros experienciais? Eu poderia sugerir ao espírito somente sossegar no calor das irradiações inframenores, porque se formos grandes sendo pacíficos não haverá tanta incidência desses abalos. O outro há de ser uma ponte a nos conduzir pela mão da empatia. Mais dia menos dia, alguém precisará de nós como quando também precisamos de uma saída. Por isso, se sair, não feche as portas, permita outras vias de acesso. Procure saber trafegar, chegar e, então, permanecer como um doce olor orvalhado, lado a lado, uma presença marcante sem provocar marcas de expressão triste no rosto. Evite o uso de máscaras, caso estas não sejam utilizadas solenemente para proteção contra tantas caras e bocas amargando à solta por aí.

A percepção aumenta na mesma proporção em que o medo diminui. Para o amor não deve haver medidas. Se houver, não há de serem rasas, finitas, e que se meça ao manter abraços abertos a todos, especialmente aos mais fechados que me cruzam os caminhos com seus galhos retorcidos, trucidados pelas podas constantes. Costumava produzir espinhos nessas horas, iludida pela possibilidade de atingir a quem me tomou as pétalas para um jogo de mal-me-queres. Quem acabava por sangrar era, tão somente, eu - empelotada dentro de mim mesma. Tão bom sentir o peito encharcar o ego sem deixar engrossar o caldo existencial, ver lágrima bem chorada afinando moléculas para, em seguida, sorrisos maiúsculos lavarem as máculas!