22 de agosto de 2013

ARVORECIDA

Quando me deprimo no cimo de querer bem, no caule sinto golpes dos que se dizem mestres, na opinião certeira sobre desistir de quem comigo se interpõe feito um machado. Põem lenha na fogueira do atavismo de achar que o mal se paga com mais mal feito, mas não deitam a cabeça sequer um instante, não apagam a mágoa com suas borrachas extraídas da seringueira derrubada. No leito, mesmo que me derrubem os galhos, continuarei natureza. A alma não estará em frangalhos pelas sementes de sol que depositei durante as fases da lua. A noite descansa com olhos semicerrados. 

O tempo germinará a cura do medo, o perdão na desventura. Ledo é o engano dos que contam bem-me-queres. Despetalam a flor ao invés de se enfeitarem no íntimo com a sua inteireza. Embelezam os caminhos que perpassam de amarelo. É certo também acentuarem o perfume nesse arrancar de ramagens, mas é a seiva de sangue que grita. Logo, o vento espalhará o talo quebrado, que perderá a cor, esmaecendo finito, porém sendo lembrado como o portador de desabrochares d'outrora. Haverá morte? Se me matam em pensamento é porque vivifico. Se me ameaçam a sorte é porque me eternizo. Meu sorriso quase raro, uma pedra de granizo. Dentes de remoer passado. Língua de cortar o aço, às vezes. Tudo porque a humanidade incide e eu a reconheço. Tendo consciência dos vícios, estes estarão a doze passos de não mais existirem. Paraíso? Desfaleço no porte, forte me ponho, readapto cresceres. O verde me amadurece e ainda não estou endurecida. Vida é partir-se ao meio, pois o meio é equilíbrio. Fruta. Do livre-arbítrio, somos árbitros, então escolho ser o sumo doce de uma maçã, para quando eu sumir lembrarem de Eva - em toda sua Gênese.

17 de agosto de 2013

NINFÁCEA

Minha piscina, por tanto lodo acumulado entre eras, está lotada de Lótus. Ela me propõe um mergulho até suas raízes mais profundas, a ensinar o vislumbre além do róseo das pétalas. Meu corpo de peso pétreo, em posição meditativa, submerge pouco a pouco, em busca do equilíbrio. Olhos fechados e silêncio. Um batismo natural feito especialmente para o homem crente no Deus que habita em si. A respiração, de tão calma, fez-me guardar ar o tempo necessário para ir e voltar de dentro. Um parto novo de mim em crescimento eterno. O topo da cabeça troca luminescências com o sol. Os pés, com o solo, tateiam uma posição de retidão agora. Mãos atadas em frente ao peito, na colheita de afetos que se abrem a cada dia. Gratidão pelas virtudes aprimoradas: discernimento e paciência. Compaixão pelos que sofrem. De toda dor se tira proveito. Aproveito para dizer o quanto sou e aceito do muito que tu és. Venho à tona com o tônus espiritual a desabrochar. Estou em paz. 

16 de agosto de 2013

ESCAPAMENTO

Buzina só contra o silêncio, que a próxima curva te deixa descansar em paz.
Bate na traseira do vento, que teu intento de voar cairá pelos ais.
Freia o que te enfeia para enfeitar com lama o canto dos pneus.
Rola o volante para o lado direito e dê carona aos pedestres.
Mestres são aqueles que beiram muitas estradas a procura de um Deus pelo retrovisor.

13 de agosto de 2013

DADA

Quanto mais se dá
Mais se tem
Faça para os outros
E para ti faça além
Bem aqui vale ouro
O outro a si vale por cem
Sem mil, terei a mim
Ao menos, que tudo sou
Que mudo, sei
Sempre me doo - de doer
Ao mundo

    9 de agosto de 2013

    PRÓSPERA

    Sinto-me enriquecida
    Sempre dadivosa, nunca endividada
    A vida é investir na vestimenta da palavra
    Só o sentimento corrente em moeda
    É da nossa conta
    Como olho d'água
    Que de fonte inesgotável tanto brota
    Cascata dourada

    Não quer o Sol, nem quer o Mar
    Porque já os têm na mão em palma
    Fecha o aplauso entre o peito:
    Namastê!
    E no leito do rio pode-se deter a calma
    Afunda o pé direito e o esquerdo
    Dentro da fé
    Celebra abundância
    Deixa borboletar a pupa da alma

    2 de agosto de 2013

    AGOSTO

    Mês dos ventos, traga-nos o que o calor levou. Saia de Marilyn Monroe e entre pela janela. Liberdade para temer o que virá, porque nunca sabemos dela. Debaixo para cima, de cabeça para um facho. Dê luz! Banhe rostos com essa fresca, lambida dos Deuses nus. Arraste o pó da estagnação e lance o pólen às fertilezas. Assim, brotaremos limpos em alma como após uma lavagem à palo seco. Seremos velhos, porém enxutos, sem essa roupa suja que se lava em casa e não a esmo, sem atingir os olhos atentos dos desamados, nem tingir os rios com sangue derramado como se fosse leite.