O que amava o amor nas cercanias da eternidade? Seria uma partícula de poeira a contagiar com espirros os seres amantes? O pólen pousado sobre narizes de esquimó? O nó de marinheiro aportado em âncora? Um porta-retrato sobre a cabeceira branca, só? Eras. Matizes da memória, entre glória e crises, quando todo o mundo se torna poeta mesmo sem dizer palavra. Dois corpos a ocupar um único banco, a bancar toda uma fonte de desejos à base de moedas antigas. Nenhum valor, o que vale é a sorte do pouso à praça. Pombos-correio a selar bilhetinhos com a precisão de seus bicos, a pisar o cimento quente empurrando as cabecinhas cintilantes de trás para frente. Idioma estranho. Portão. Sofá. Cinema. O problema é prestar atenção, sem calcular a medianiz exata dos batimentos cardíacos por debaixo da blusa.
Quem usa quem por paixão, desgoverna um império todo, ataca por instinto de sedução? O risco do batom delimita em vermelho o que lhe compete, quando a guerra dos sexos vira briga de travesseiros. Beija o espelho, bebe no mesmo copo, suja lençol, toalha, fralda, desamarra calção, lava o pé após tê-lo enfiado na jaca. Jecas tatu a pisar lama, pulando em seguida na cama. Comprazem-se com a poluição sonora de dardejar gemidos à vizinhança inteira. Crianças. Senhores. Jovens. Macacos. Todos acionam os tambores, quebram altas janelas e perfumes em frascos, disparam os alarmes dos carros pelos arroubos. - Isso é um assalto! As mãos ao alto denunciam um pedido aos céus, tomados por uma fé maior em si mesmos. Sem véus ou grinalda, nada de réus ou juízes. Felizes. Amar deve ser como contar até mil a fim de evitar chiliques, usar o cerebelo nos momentos de catarse, fazendo das sinapses a sinopse de um livro sem fim. Um ritual do chá. Um laço de cetim à cabeça da menina. Uma seta ao paraíso. Indriso.
Visgo de vela em roupa, grudando o algodão à ferida. Um curativo que arde, mas cura até que cicatrize. Cultivam-se varizes de tanto andar e percorrer grandes lonjuras por várias vezes, tamanha é a vida. Arrebentam raízes. Juras de amor devem haver no momento em que se tilintam as taças ou se tocam os dentes. Há mentes que se fartam só de sonhar com os seus descendentes, na ascendência das estrelas, a agradecer por tudo que existe e existirá até não mais nos pertencer. Saberemos amar quando uma dor começar a se esquecer de si e olvidar da composição com que foi feito o estupor. Como são? Extinto o medo, resplandecerão sementes douradas, brotará mais de um sol para cada adorada manhã. A qualquer hora, saberemos. Saboreemos instantes.