17 de junho de 2012

PREVISÃO



Lembro-me vagamente de quando um colega zen de faculdade me revelou as suas cartas de tarô e me mostrou sobre o birô dos professores alguns caminhos pelos quais possivelmente eu poderia trilhar, por expansão individual ou divina ou por teimosia minha desafiando a trajetória cósmica. Ele me falou que eu iria passar por um período crítico no auge dos meus vinte e poucos anos, mas que depois de um tempo voltaria a ficar bem, estável, só não me recordo em que área, se amorosa, profissional ou no todo mesmo. Bom, o certo é que estou beirando os trinta e fugi de um provável casamento para experimentar um novo relacionamento e ainda não encontrei emprego fixo, muito provavelmente porque não tenha me esmerado na procura, aguardando minha satisfação se manifestar em grau mais elevado. Isto em razão da minha propensão às artes ser enfática, mesmo sabendo que me manter é preciso e ser artista neste país, quanto mais neste estado, faz-se árdua tarefa com pouca compensação financeira. Eu teria de ser um achado literário, plástico, performático e musical, ter reconhecimento ampliado. Às vezes acho que faço pouco, contudo olho para trás e vejo o meu rastro por aí, então me orgulho, nesse pedacinho de mundo que se perde entre o real, o virtual e o ficcionado. Abstraio sem me trair muito. 

Atualmente, como graduada em Letras, faço trabalhos fortuitos em instituições de ensino na área de língua portuguesa, inglesa e literaturas, entretanto lucro mais como freelancer de revisão de textos, transcrição de áudio, vídeo e também tradução. Empenho-me na administração prazerosa de uma porção de blogues e redes sociais, além de me enveredar por vertentes as mais alternativas, como ter produzido um sarau em um bar cultural da cidade, ter pertencido a bandas de rock e com novas ideias musicais sempre moventes no cenário local. No momento, tenho me metido a mostrar a cara em curtas metragem, brincando de ser atriz no meio da turma do cinema na universidade. Falta-me apenas por o pezinho no teatro, para fechar o ciclo das artes e me tornar deveras multimídia. Sinto que isto não demorará tanto. Ainda pretendo expor minhas colagens e outros trabalhos gráficos afins, explorar novos meios. Tenho a mão boa. Alguém muito especial me falou um dia que sou meio Midas. Então prefiro enxergar-me assim, artesã nata do chapisco ao ouro. O que virá me provoca ansiedade, tenho dúzias de dúvidas, porém a maior certeza de que tudo valerá a pena reduz o desgaste. Almejo viagens e enriquecimento espiritual, acima do que for tangente e tangível. Não consigo me vislumbrar mãe, quero todo o tempo para gestar as minhas obras, mais tarde, quem sabe, ter um menino. Deus que me guarde e aguarde.

7 de junho de 2012

PERFUME

Felicidade não me cheira bem, 
Quando se esvai a cada passo. 
Feliz: nem o nariz do palhaço.

Paola Benevides

6 de junho de 2012

EXCREÇÃO


De três catarses orgânicas, as sensações mais prazerosas que defini para mim foram: dar uma mijada quando se está muito apertado com o acúmulo de líquidos na bexiga; ornar uma bela cagada com mil peidos despreocupados no momento em que suas tripas não podem segurar por mais nem um segundo; e gozar, suando brutalmente por todos os poros, acelerando batimentos cardíacos, perdendo o fôlego e embaralhando as outras sensibilidades por tamanho alívio, a ponto de nos fazer urrar. Os homens concretizam o ato ao lançar o sêmen ao mundo.

Afrouxar as partes baixas me parece o melhor dos descarregos corporais. É certo que existem as lágrimas, o vômito, a cusparada ou a escarrada de uma espessa placa de catarro preso, por exemplo, mas imagino serem esses tipos de despejo os mais desconfortáveis, por causarem alguma dor ou náusea dentro do refrigério gerado pela expulsão de substâncias desnecessárias ao organismo. No caso do choro, o que se é liberado mesmo são as dores de alma, irretocáveis. Pranto este que pode ser acometido pela felicidade também. Já as gargalhadas são um extravaso quase insano quando ri-se de nervoso ou da desgraça do outro. No sono, o ronco é uma liberação das mais inconvenientes, óbvio que para quem dorme ao lado do causador. E tudo começa com um bocejo, essa soltura de ar pela boca que denota, além do sono, um explícito entediamento. Não bastassem tantas crianças no mundo para sofrer com suas ejaculações existenciais precocemente, imaginem o parto como deve ser, certamente a experiência de soltura mais sublime é haver um ser dentro do outro. O que me leva a crer que jorrar faz bem e transbordar é para lá de humano.

5 de junho de 2012

CIRCULAÇÃO

Circulation through the heart

Torça para que um dia
teu abatimento cardíaco vire força, 
que mesmo no leito tenhas peito de viver 
com o coração a pular estagnadas poças.